ENTENDA OS CÂMBIOS DE DUPLA EMBREAGEM
Oferecido pela primeira vez em um veículo nacional (com o EcoSport), câmbio automatizado com duas embreagens guarda diferenças de concepção e lubrificação
Variações de câmbio não fazem parte apenas do mundo da economia. É
assim também com os carros. É só ver. Primeiro vieram os manuais, depois
os automáticos, os de variação contínua e, por último, os manuais
automatizados. Estes se dividem entre os de embreagem única e os de
dupla embreagem. Aproveitamos o lançamento do Ford EcoSport Powershift, o
primeiro carro brasileiro automatizado de dupla embreagem, para
desvendarmos o que há por dentro dessas caixas.
O princípio de operação já é manjado. Como o nome deixa (bem) claro,
são duas embreagens no lugar do conversor de torque que seria usado em
uma transmissão automática. “São dois discos de embreagem. Um deles
aciona todas as marchas pares e a marcha ré, enquanto outro disco menor
aciona as ímpares. Assim você tem sempre todas as engrenagens de marcha
prontas para ser usadas. O que se desloca é apenas o disco, deixando
sempre a marcha seguinte pré-acionada”, explica Nivaldo Mattos, gerente
de serviços da Mercedes-Benz do Brasil. Um módulo de controle ligado ao
módulo central do veículo gerencia tudo, levando em consideração
parâmetros como se o carro está numa curva, numa reta ou desaceleração,
variáveis que indicam ao módulo qual é a marcha mais adequada para a
situação.
Falando assim, parece simples. Mas a solução começou com um palavrão de
quebrar a cabeça: Doppelkupplungsgetriebe. Em bom português, isso pode
ser traduzido simplesmente como câmbio de dupla embreagem. Foi usado
primeiro pela Porsche nos anos 80, em carros de pista como o 956 e 962, e
também pela Audi, no Quattro S1 de rali. Demorou 20 anos para aparecer
nas ruas. O primeiro foi o já famoso DSG (Direct-Shift Gearbox) da VW,
que estreou no Golf R32, o nosso Golf de quarta geração, só que equipado
com motor 3.2 V6 e tração integral. Não demorou a se espalhar por
outros modelos do grupo alemão e, logo depois, estava em várias outras
casas.
Não é por menos. O sistema tem várias vantagens face os automáticos. A
começar pelo peso. “A caixa Powershift do EcoSport é até 20 kg mais leve
do que uma automática com o mesmo número de velocidades”, garante Fábio
Okano, gerente de engenharia da Ford responsável pelo projeto do carro.
“Além disso, faz trocas mais rápidas, em até 1/3 do tempo”, completa o
engenheiro. As embreagens funcionam bem mais rápido que um conversor de
torque, cujo deslizamento atrasa um pouco a prontidão na operação de
troca. Por isso mesmo, a Mercedes-Benz prefere usar embreagem no câmbio
automático Speedshift de cinco marchas dos AMG. “Você ganha um pouco de
velocidade na troca de marcha e tem patinagem bem menor”, explica
Nivaldo Mattos, da Mercedes.
Vantagens
A balança não é o único quesito em que as automatizadas de dupla
embreagem se dão melhor. Por mais incrível que pareça, a complexidade e o
tamanho costumam ser menores. “Esse tipo de caixa é mais simples de se
trabalhar, você não tem todos os problemas de um automático. É mais
fácil para um técnico dizer o que está errado ali”, aposta o gerente da
Mercedes. Além disso, nesses câmbios, o conjunto é mais compacto, pois
os pares de engrenagens dos grupos de marchas ficam em árvores
paralelas, enquanto em um automático os pares são um atrás do outro,
longitudinais.
As vantagens mais claras para o consumidor são as ligadas diretamente à
utilização diária. Os automatizados são mais econômicos, até 10% a mais
que um automático convencional, o que ajuda os fabricantes a driblar os
restritos limites de emissões impostos nos mercados mais desenvolvidos.
A suavidade e rapidez de operação também são claras. Embora
automatizados com uma embreagem possam ser mais ligeiros em alguns
casos, todos preservam o incômodo dos trancos nas passagens, algo que é
extirpado nos de dupla.
Caixas secas
As automatizadas de dupla embreagem têm particularidades. Há caixas
úmidas e secas mesmo na mesma casa, muda apenas o sistema de
lubrificação das embreagens. Isso acontece com a Volkswagen, cujo DSG
úmido de seis marchas usado em Jetta e Fusca têm a mesma denominação do
DSG de sete velocidades a seco do Audi A1. O mesmo ocorre na Ford, onde o
Powershift do Eco é seco e o “mesmo” Powershift usado no Volvo V60 é
úmido – a marca sueca pertencia ao grupo até há pouco tempo. Há
protótipos de mecanismos completamente eletrônicos, porém nenhum deles
foi aplicado comercialmente.
A caixa a seco é ainda menor e mais leve (dispensa alguns bons litros
de óleo e radiador). Porém, nem tudo são flores. “As banhadas a óleo são
mais suaves, não apresentam tantos delays e são menos ruidosas. Quando
se trafega sobre piso ruim, o contato sobre as placas das secas é
ouvido”, compara Jorge Mussi, diretor de serviços ao consumidor da
Volvo. Produzido no México, o câmbio do EcoSport é do tipo que dispensa o
óleo nos discos de embreagem, feitos para se trabalhar em alta
temperatura sem lubrificação. “Essa caixa tem que ter maior cuidado na
instalação, com maior atenção aos coxins que vão isolar esses ruídos,
mas não chegam a ser sempre mais barulhentas”, defende Fábio Okano, da
Ford.
Outro problema que acomete tanto os câmbios de dupla embreagem a seco
quanto úmidos é o atraso de respostas em algumas situações. “O sistema
eletrohidráulico atua sob a demanda das trocas de marcha. Até a pressão
ser criada para permitir a troca, existe um pequeno atraso. Quando quase
se para um automatizado em um cruzamento, você tem que elevar novamente
essa pressão hidráulica para ele engatar a marcha exigida. Esse delay
diminui em velocidades mais elevadas porque a pressão fica mais
constante”, analisa Jorge Mussi, da Volvo.
Ainda assim, eles são unânimes em apontar os manuais automatizados de
dupla embreagem como a verdadeira revolução, deixando de lado outras
soluções promissoras, como o CVT, de variação contínua, composto,
basicamente, por polias que se ajustam para sempre entregar a resposta
ideal. “Mesmo o câmbio CVT de poucas partes móveis e durabilidade quase
infinita foi criado nos anos 50”, aponta Nivaldo, da Mercedes. “Tenho
minhas dúvidas se o CVT seria mais econômico que os automatizados. Além
do mais, ele tem um custo unitário maior e faz operações manuais mais
lentas”, afirma Jorge, da Volvo.
Fonte: Autoesporte
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